Greve nos Correios joga PT contra PT
Há uma novidade na relação do governo federal com as greves no setor público. A direção dos Correios,
que é do PT, resolveu endurecer - como nunca antes nos últimos sete
anos - na negociação com os sindicatos da categoria, que é filiada à
Central Única dos Trabalhadores (CUT). Hoje a Justiça do Trabalho
realiza a primeira audiência de conciliação, após 21 dias de greve dos
carteiros. Ação de dissídio coletivo ajuizada pela ECT.
"Em oito anos do
governo Lula negociei seis greves, uma delas de 21 dias", diz o
secretário-geral da Federação Nacional dos Trabalhadores nos Correios, José Rivaldo da Silva. "Negociamos com o próprio Lula e não houve desconto de dias parados. Houve compensação". A direção dos Correios não aceita fazer acordo em torno dos dias parados.
Rivaldo da Silva
explica a distinção: "Os carteiros não pedem pura e simplesmente o
pagamento dos dias parados, ao final da greve. Eles se comprometem a
compensá-los trabalhando fora do horário normal do expediente". Aos
sábados, por exemplo.
A impressão de
Rivaldo da Silva é que a ECT colocou a questão do "desconto" na folha de
pagamentos como questão de honra. Assim levaria os funcionários a
pensar duas vezes antes de decretar uma greve no próximo ano. Nos Correios, a expressão empregada é "reeducação" do movimento sindical, para irritação dos sindicalistas.
A percepção de
Rivaldo da Silva não é desproposital. A presidente Dilma Rousseff tem
registrado "ameaças" de paralisações de algumas categorias de primeira
linha do serviço público, como as de servidores da Polícia Federal e da
Secretaria da Receita Federal, e a todos os "recados" tem respondido da
mesma maneira: não vai ceder nas negociações: 2011 é igual a zero de
aumento. Pelo menos nesses dois casos.
Os
servidores da PF e da SRF integram carreiras de Estado e estão entre os
mais bem remunerados do funcionalismo público, o que não é o caso dos
carteiros. A ECT fez uma contraproposta: inflação do periodo
(6,87%), mais R$ 50 de reajuste linear para todos e a inflação nos
demais benefícios, como vale refeição, auxilio-creche. A proposta foi
recusada pela categoria.
Os Correios estão
na linha de tiro da presidente por outro motivo. A ECT é um dos três
órgãos públicos nos quais botou um "xerife" para organizar a casa,
desarrumada após anos de gestão rateada entre os partidos integrantes da
base aliada do governo.
As outras duas são a
Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e Furnas Centrais Elétricas, não por
acaso, até recentemente domínios do PMDB. Um escândalo nos Correios foi
a ponta do fio do novelo que levou até o mensalão, o esquema
supostamente de compra de votos (há quem diga que se tratou de caixa 2
de campanha) pelo governo Lula no Congresso.
O jogo duro da direção dos Correios é
o que efetivamente "prejudica a população", diz Rivaldo da Silva,
invertendo responsabilidade em geral atribuída aos grevistas, nos
movimentos paredistas. São cerca de 40 milhões de objetos que deixam de
ser diariamente entregues em todo o país. O desabafo de Rivaldo da Silva
é feito na medida exata das dificuldades registradas na atual
negociação.
"O
que o presidente da ECT, que é do PT, foi do Sindicato dos Bancários,
Wagner Pinheiro, tá fazendo é terrorismo", diz Rivaldo da Silva. "Você
sabia que ele antecipou o pagamento da folha, com descontos dos dias
parados, só para fazer terrorismo, agitar ainda mais a categoria"?
ACM "foi o nosso
algoz", diz Rivaldo da Silva, referindo-se ao senador baiano Antônio
Carlos Magalhães, ministro das Comunicações no governo José Sarney,
morto em 2007) " Ele (Wagner) é pior do que o ACM Nem ACM fez isso.
Houve desconto com ACM, sim, mas até ele esperava terminar a greve para
tomar uma decisão como essa. Nunca houve antecipação de folha de
pagamento com desconto para apavorar".
Rivaldo participou de
cinco negociações com o PMDB, "que a gente tanto quis fora da empresa".
E nas quatro greves realizadas com os pemedebistas na diretoria, "a
negociação era estabelecida, abria-se imediatamente um canal de diálogo,
de negociação para achar uma solução, uma proposta aceita pela base",
conta. "Infelizmente, com os companheiros do PT não estamos encontrando a mesma abertura para o diálogo.
E, olhe que iniciamos a negociação da data base há 46 dias e até agora
não chegamos a um entendimento, a uma proposta que fosse defensável nas
nossas assembleias".
A reação do ministro
Paulo Bernardo (Comunicações), a quem está subordinada a ECT, também
deixou perplexo o comando de greve na empresa. Basta ver o espanto
demonstrado por Rivaldo da Silva: "Ele disse que os trabalhadores dos Correios não estão de greve, mas de férias. Não falei que está pior do que na época do ACM e que é mais fácil negociar com o PMDB"?
Sem acordo com o
ministério nem com a presidência da ECT, os grevistas tentaram vias
alternativas. Além da diretoria de Recursos Humanos dos Correios,
os sindicalistas também procuraram o assessor para assuntos sindicais
do ministro Gilberto Carvalho (Secretaria Geral da Presidência), José
Lopes Feijóo, que renunciou a uma vice-presidência da CUT para trabalhar
no Palácio do Planalto. Deu em nada, muito embora os sindicalistas
ressalvem que Feijóo tentou ajudar.
Digno de registro é o fato de que os trabalhadores nos Correios nem
sequer pensaram em pedir a intermediação do ministro do Trabalho,
Carlos Lupi. Há outras greves em andamento no país, como a dos
bancários, mas nenhuma notícia sobre o envolvimento do ministro do PDT
em negociações com os trabalhadores. Nem de que ele esteja fazendo falta
à mesa.
"A gente vê horizonte
para conseguir um reajuste, mas não vê horizonte para se chegar a um acordo quanto a dias parados", diz Rivaldo Dias. "E a gente pensava que era gente nossa".
De acordo com o sindicalista, o desconto dos dias parados "coloca mais
combustível" na greve. "Lamentamos isso que está ocorrendo com a nova
diretoria da ECT".
FONTE: Jornal Valor Econômico
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